sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Vulnerabildiade e Fluxos Cambiais

Guaxinim de volta!

Finalmente saíram os números do balanço de pagamentos, divulgados pelo Banco Central.

O assunto é árido, mas importante. Ele se relaciona com a vulnerabilidade de um país. Mas o que é vulnerabilidade? É quanto o setor externo pode influenciar uma economia, impactando o crescimento e o seu desenvolvimento.

A vulnerabilidade é determinada por (1) credibilidade da política econômica, (2) tamanho dos mercados financeiros do país e (3) dimensão dos fluxos de capitais em relação à economia local.

Um assunto que deve aparecer na eleição é a crise de confiança do mundo em relação ao Brasil. O balanço de pagamentos é um bom indício do "estado das coisas" no setor externo.

Vamos começar pelas conclusões:
  • A estrutura do balanço de pagamentos brasileiro piorou sob diferentes e importantes aspectos, e isso parece ser uma tendência.
  • O déficit em transações correntes (balança comercial + serviços + rendas + transferências) só piorou desde 2008 e bateu recorde negativo de USD 81,3 bilhões em 2013.
  • O desempenho comercial do Brasil foi pífio em 2013, ficando no menor valor dos últimos 12 anos, e caindo 87% em relação à 2012, devido a importações maiores.
  • O Brasil contrata cada vez mais serviços no exterior (aluguel, transporte, turismo, consultorias etc), isso mostra falta de expertise local. Recorde negativo em 2013 de USD 47,5 bilhões.
  • A conta rendas (salários, lucros e dividendos pagos, juros e amortização de empréstimos etc) também piorou nos últimos anos.
  • O ano de 2013 foi o primeiro nos últimos 12 anos que o déficit superou o valor de investimento estrangeiro direto.
  • Em 2013, passamos a financiar o déficit por investimento em carteira (dívida e ações).
  • O financiamento via dívida e ações dependem muito do momento econômico e são mais voláteis. 
  • O risco de crédito do Brasil vem piorando, o que afeta a captação via renda fixa.
  •  Nas ações, a atividade econômica está fraca, os preços de commodities caíram, a Petrobrás que compõe boa parte do índice está sendo vítima da ingerência do governo. E outras economias do mundo tem se mostrado mais atraentes do que o Brasil, o que faz diferença para quem gerencia portfólios globais.
Olhamos para os países como Grécia, Portugal, Espanha e Itália e pensamos que essa realidade é diferente da brasileira. Um dos motivos para a crise nesses países, foi o aumento do endividamento externo para financiar crescentes déficits em transações correntes.

No Brasil, até 2012 ao menos, os déficits eram financiados por fluxos de investimentos estrangeiros diretos. Mas esquecem que esse investimento precisará ser remunerado, ou seja, levarão também ao aumento da conta "rendas" quando os dividendos forem pagos. Mas são considerados uma boa fonte de financiamento, por serem mais estáveis e de longo prazo. Mas agora utilizamos também capitais mais instáveis e de curto prazo.

Até o momento, o mix está favorável, com demanda para dívida e ações do setor privado. Mas isso pode mudar caso o governo continue aumentando a dívida interna de forma irresponsável e conduzindo a política econômica por critérios politicamente enviesados, afastando o bom senso econômico.

As exportações não se beneficiam mais de preços de commodities altas, o PIB está fraco e a inflação alta. Não é um cenário muito atraente, e a credibilidade da política econômica vem sendo questionada pelos mercados financeiros há algum tempo.
O lado positivo é que Brasil está melhor posicionado quanto ao tamanho do mercado e a dimensão dos fluxos, quesitos para a vulnerabilidade externa.

Então, o "estado das coisas" não parece bom. Sob esse ponto de vista, um real desvalorizado, na casa dos 2,20 - 2,60 deve ser a tendência para 2014.

E essa é uma das razões para o governo estar a contragosto fazendo concessões de rodovias e aeroportos (para aumentar o investimento estrangeiro direto).
Também explica tentativas recentes de acordos comerciais. Dado que o sinal amarelo aceso na balança comercial foi causado por um Itamaraty mais ideológico e menos pragmático em relação a acordos de troca com Mercosul e outros países.

No fundo, é mais um exemplo da falta de visão de longo prazo na condução da política econômica do país que vai minando a estabilidade da economia.

Para finalizar, deixo os gráficos que foram a base da análise. Todos os valores estão em milhões de dólares e mostram os saldos acumulados ao ano em cada uma das contas, de 2002 a 2013.

Transações Correntes: para o fundo do poço e além!
Comércio Internacional: importando cada vez mais para consumir.
Serviços: made in Brazil? Nem pensar!
Rendas: juros e dividendos remunerando uma base crescente nos últimos anos.
Investimento Direto: privatização? Compro no Brasil ou no México?
Investimento em Renda Fixa: e se o risco-país aumentar?
Investimento em Ações: porque não comprar nos EUA, onde o PIB deve crescer mais?

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Mais um marco histórico.

Atingimos um marco histórico em novembro de 2013.

A dívida pública federal alcançou o incrível valor de dois trilhões, noventa e sete bilhões, duzentos e cinquenta e seis milhões, cento e cinquenta e três mil, seiscentos e trinta e dois reais e setenta e quatro centavos (ou 2.097.256.153.632,74).

Sem que se fizesse muito alarde, o Governo Federal agora está em débito em mais de 2,09 trilhões de reais.  

Para efeito de comparação, o PIB do Brasil (soma do valor final de tudo o que é produzido no país no período), está pouco acima de 4,40 trilhões de reais.

A dívida do governo federal cresceu de dezembro 1995 até novembro de 2013, à uma taxa média de 23% ao ano (o período foi dado pela disponibilidade de informação no tesouro nacional).

E qual o resultado do aumento deste endividamento? Quando este tópico é trazido à tona, aparecem questões como o pagamento da dívida externa (falácia desmentida pelo gráfico ao final), heranças malditas, gastos com previdência, investimentos sociais, etc. E isso só afasta a discussão do seu ponto central, e esses tópicos não passam pela solução do problema.

Se a dívida do governo sobe, ela sobe porque ele tem uma receita de impostos, despesas diversas (incluindo juros da própria dívida) e no final sobram ou faltam recursos. No segundo caso, a falta de recursos leva ao financiamento via empréstimo para cobrir a conta. Tão simples quanto isso.

O país tem crescido nos últimos anos, e a receita de impostos do governo federal aumentou. As despesas aumentaram num ritmo ainda maior, e o endividamento cresceu.

Mas o país se endivida para que? Estamos financiando que tipos de gastos? Caso a dívida tivesse sido contraída para investimentos em setores como saúde, educação, infraestrutura, com base num crescimento da dívida de 23% ao ano, aliado ao crescimento do PIB, seria lógico supor que deveríamos ter observado substanciais avanços nas áreas sob a tutela do setor público. Mas não é o que a realidade mostra.

O que se vê são governantes reclamando porque não podem subir impostos ou porque não podem reinstituir contribuições que deixaram de ser cobradas.


Atualmente, o crescimento da dívida se justifica sob um argumento de que ela está ficando mais sustentável. Não é o objetivo deste post colocar esse argumento à prova, porque uma dívida sustentável não quer dizer que ela tenha sido tomada por necessidades intrínsicamente positivas. 

O modo brasileiro de fazer política, que na prática é só o bom e velho clientelismo, impede o país de fazer as reformas necessárias para evitar que o país aumente suas dívidas a taxas de dois dígitos ao ano sem nenhum benefício para o seu povo. 

Todo mundo tem que estar com seus interesses atendidos, e para que um pequeno número de interesses individuais e projetos de poder sejam atendidos, é imposta uma carga desnecessária ao país todo, ao melhor estílo Brasil Império.

A evolução do problema: uma hora a conta chega.




Fontes: e Secretaria do Tesouro Nacional e Ipeadata.gov.br